Por Sofia Frazoa
in REVISTA PROGREDIR | SETEMBRO 2012
(clique no link acima para ler o artigo na Revista)
Vários estudos sobre violência doméstica, feitos em Portugal nos últimos 10 anos, têm revelado que há um grande problema estrutural assente em papéis de género que se foram criando, interiorizando e reproduzindo ao longo do tempo, quer pelos agressores, quer pelas vítimas. Sentimentos como a vergonha, a culpa ou a desonra familiar estão também na origem da passividade das vítimas face à violência. Este é um dos exemplos extremos de como a educação e os modelos a que assistimos desde crianças podem influenciar o modo como pensamos e vemos o mundo. Vamos sempre a tempo de evoluirmos e de mudarmos de perspetiva, mas não podemos esperar que seja o mundo a dar-nos essa renovação para nos sentirmos mais livres e renovado/as. O que podemos fazer para começar a mudar mentalidades?
1 – Rever os padrões de pensamento
Por detrás de um determinado tipo de comportamento ou maneira de pensar está, quase sempre, um modelo que já vimos nos nossos educadores e passámos a reproduzir. Até que ponto este padrão não está datado no tempo e a precisar de renovação? Este padrão ou maneira de pensar traz harmonia e felicidade aos outros e a mim mesmo/a?
2 – Ter uma atitude humilde
Ninguém é dono da razão e a prova disso é que o mundo é cheio de pessoas, culturas, maneiras de pensar e filosofias diferentes. Assim sendo, devo ter a capacidade de ser humilde para reconhecer que as minhas ideias são produto da minha experiência de vida e apenas um dos milhões de hipóteses de ver e compreender o mundo. Assim, posso aproveitar algumas das experiências e maneiras de pensar dos outros para acrescentar à minha própria evolução e experiência.
3 – Ousar romper com o instituído
Um dos exemplos mais clássicos de padrão instituído que os estudos de género tentam desmontar é a diferença entre homens e mulheres. Claramente não só, mas com grande expressão em zonas mais desfavorecidas, interiores e isoladas do país, ainda se continua a utilizar muito a ideia de que “os homens são todos iguais”. Não descurando as óbvias diferenças biológicas e neurológicas entre homens e mulheres, é importante lembrar que a cultura e a educação têm um papel essencial na construção do “produto” homem ou mulher (ou masculino e feminino, se falarmos de género). Assim sendo, como forma de ousar romper com o valor instituído, costumo sugerir que nos questionemos: E as mulheres são todas iguais? Só existem então dois tipos de pessoas: homens ou mulheres? Se a resposta a estas duas perguntas for “não”, sugiro que ousemos pensar que, afinal, os homens também podem não ser todos iguais.
4 – Criar novos valores
Desmontando os valores instituídos que não contribuem para a nossa evolução e felicidade, é chegado o momento de renovar o nosso stock e substituir o que cheira a mofo pela novidade e novas oportunidades. Pode ser difícil, inicialmente, criar um novo pacote de medidas para renovar a nossa vida, mas podemos começar por nos apoiar nas razões que nos levaram a cortar com o velho. Por exemplo, se percebe que um dos seus padrões é considerar que ninguém é digno de confiança, o convite é começar a pensar que há pessoas dignas de confiança e, a pouco e pouco, ir abrindo espaço interior para confiar nos outros.
5 – Ser coerente na forma de pensar e agir
Qualquer pessoa falha e tem os seus momentos de incoerência e de aprendizagem, no entanto, para conseguir influenciar pelo exemplo e contribuir para renovar mentalidades é essencial que a nossa maneira de agir corresponda ao que pensamos e dizemos pensar. As transformações a que assistimos mundialmente convidam-nos a ser cada vez mais verdadeiro/as e coerentes connosco. Deixou de fazer sentido, sobretudo passada a adolescência, tentar encaixar no que os outros pensam para ser aceite e reconhecido/a. Se não renovamos, mantemos a mentalidade antiga e continuamos reféns do todo.
Essencial, em alturas de crise que apelam à mudança e renovação, é nunca esquecermos que o respeito por nós vem em primeiro lugar, mas implica sempre - e em simultâneo – um respeito profundo pelo outro. Ou corre o risco de ser um ato egoísta disfarçado de evolução e renovação do ser.