in REVISTA PROGREDIR |NOVEMBRO 2018
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A procrastinação é uma forma de fracasso autorregulatório no qual adiamos voluntariamente um curso de ação apesar de esperarmos um resultado pior devido a esse mesmo adiamento (Steel, 2007). Ou seja, é adiar o que temos de fazer, mesmo sabendo que vamos sofrer consequências negativas. Entre 20 e 25% dos adultos normais nos EUA e noutros países foram classificados como “procrastinadores crónicos”, ou seja, indivíduos que adiam desnecessariamente tarefas importantes em diversas áreas da vida: saúde, trabalho, escola e relacionamentos (Ferrari, Barnes e Steel, 2009).
Embora todos nós já tenhamos adiado algo, nem todos somos procrastinadores. Adiar e procrastinar não são a mesma coisa. O adiar desnecessário, irracional ou até nocivo de tarefas importantes para o próprio bem-estar, é o que distingue a procrastinação do “adiar estratégico” (Klingsieck, 2013), onde as eventuais consequências negativas serão mais tarde ultrapassadas pelas positivas. Por exemplo, quando mantemos um relacionamento momentaneamente difícil, esperando que melhore assim que algumas situações sejam ultrapassadas, como a morte de um familiar ou o nascimento de um filho.
Os procrastinadores crónicos costumam ter uma baixa conscienciosidade, persistência e autoestima, o que os pode levar a autossabotarem as suas próprias ações por medo de falharem (Ferrari e Díaz-Morales, 2007). Parece um contrassenso mas, se eu nem tentar fazer algo, como poderei falhar?
Como procrastinar pode prejudicar os relacionamentos
A procrastinação pode ter um impacto significativo em todas as áreas da vida, incluindo nas relações afetivas, que se podem tornar tensas e conflituosas, sobretudo com os familiares e amigos mais chegados (Ferrari, Harriott e Zimmerman, 1998). Por exemplo, pode frustrar e/ou enfurecer um parceiro porque as tarefas que têm de ser realizadas (como as domésticas) são frequentemente adiadas. Num estudo publicado em 2013, a psicóloga Katrin B. Klingsieck desenha o retrato do típico procrastinador:
- Os homens tendem a procrastinar mais do que as mulheres; uma evidência é o facto de a maioria deixar a escola mais cedo.
- Com a idade, vamos procrastinando menos;
- Os procrastinadores tendem a investir menos num relacionamento estável, mantendo-se solteiros. Para além de adiar o início das relações, também tendem a adiar o fim de um relacionamento infeliz.
O que pode fazer para vencer a procrastinação?
O primeiro passo é tomar consciência. Há que sair do chamado estádio de contemplação, onde existe resistência à mudança e a crença de que não há motivo para mudar. É fundamental encontrar em si mesmo a razão de mudar e os benefícios para a sua vida e a dos outros (e também os riscos de não o fazer). Só depois pode avançar para os outros estádios da mudança: preparação, ação e manutenção (Miller e Rollnick, 2012).
O segundo passo é perceber quais os motivos que levam a procrastinar e que tipo de modelos mentais limitadores estão por detrás. Alguns exemplos:
“Não sei por onde começar tudo o que tenho de fazer.”- Faça um pouco cada dia, em vez de acumular até chegar a proporções demasiado difíceis de lidar (seja arrumar a casa ou escrever a tese). Se houver um prazo, não deixe para o último minuto. Muitos procrastinadores pensam que funcionam melhor sob pressão, mas isso equivale a dizer que não têm controlo sobre as circunstâncias. Estabeleça um plano para cada um dos passos e respeite-o.
“Não sei como fazer.”- Muitas vezes, temos muito mais do que pensamos. Seja o apoio de alguém ou a memória do que já conseguimos alcançar. Encontre também formas de conseguir as ferramentas ou competências que ainda lhe faltam tirando um curso, lendo livros e, sobretudo, praticando. Tenha paciência com o processo de aprendizagem. Quanto mais praticar, melhor vai consegui fazer.
“Tem de ser perfeito, senão não vale a pena!”- O medo da crítica e da rejeição advêm de uma tentativa de preservar a autoestima. A procura da perfeição, inalcançável, remete-nos para um futuro incerto e leva-nos a adiar por medo de falhar. Foque-se no momento, no que está a fazer agora, mais do que no resultado. Desfrute do processo, faça para si e não para os outros. Seja compassivo para consigo, estabeleça padrões razoáveis e não se compare aos outros; ao dar-se permissão para não ser o melhor, cria as condições para que as suas qualidades únicas transpareçam.
Finalmente, mantenha-se no caminho, mesmo quando ocorrerem retrocessos. Estes são normais e fazem parte do processo. Na mudança, a fase da manutenção implica a renovação diária do nosso compromisso para com a ação, para com o nosso bem-estar. Só assim poderá quebrar o hábito de procrastinar e reencontrar uma nova forma de viver melhor consigo e com os outros.
Referências bibliográficas:
Ferrari, J. R., Barnes, K. L., & Steel, P. (2009). Life Regrets by Avoidant and Arousal Procrastinators: Why Put Off Today What You Will Regret Tomorrow? Journal of Individual Differences, Vol. 30(3):163–168.
Ferrari, J. R., Harriott, J. S., & Zimmerman, M. (1999). The social support networks of procrastinators: Friends or family in times of trouble? Personality and Individual Differences 26, 321-331.
Klingsieck, K. B. (2013). Procrastination: When Good Things Don’t Come to Those Who Wait. European Psychologist 2013; Vol. 18(1):24–34.
Miller, W. R., & Rollnick, S. (2012). Entrevista Motivacional, Preparando as Pessoas para a Mudança (3ª Edição). Climepsi Editores.
Psychology of Procrastination: Why People Put Off Important Tasks Until the Last Minute. (2010). Five questions for Joseph Ferrari, PhD. American Psychological Association (www.APA.org).
Steel, P. (2007). The nature of procrastination: A meta-analytic and theoretical review of quintessential self-regulatory failure. Psychological Bulletin, 133, 65–94.
Steel, P., & Ferrari, J. R. (2012). Sex, Education and Procrastination: An Epidemiological Study of Procrastinators’ Characteristics from a Global Sample. European Journal of Personality, Eur. J. Pers.
PSICÓLOGA ORGANIZACIONAL, CERTIFICADA EM INTELIGÊNCIA EMOCIONAL E COACHING PSICOLÓGICO
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