Por Maria José Costa Félix
in REVISTA PROGREDIR | AGOSTO 2012
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Aprender a viver é aprender a romper, a largar algo que nos dá segurança e identifica. Tomar consciência da necessidade dessa aprendizagem pelo facto de haver em nós um espírito imortal e um corpo mortal com necessidades transitórias.
Essa tomada de consciência implica enfrentar o combate entre o mundo do Ser e o do Ter, as forças do Bem e as do Mal, a Luz e a Sombra que nos habitam. Assim como não recusar a dor, não fugir ao sentimento de perda, sempre que revivemos essa experiência primeira de corte do cordão umbilical.
Ou seja, implica aceitar sem amargura as variadas mudanças que ocorrem ao longo da nossa passagem por este mundo.
E existem mudanças especialmente importantes que nos acontecem em qualquer fase da vida: o começo ou o fim de uma relação de amor, o final de um emprego ou o início de outro, uma mudança de casa ou de país…
A alteração de algo que, durante um tempo, foi para nós uma base de sustentação, ao nos destapar e deixar a descoberto fragilidades, inseguranças, carências, mágoas vindas de longe, trabalhos de luto não empreendidos ou concluídos, como que nos esvazia de nós.
Há referências que desaparecem. Pessoas que deixamos de ver. Hábitos que se alteram. E representa sempre um abanão no nosso sentido de identidade. Por vezes uma cambalhota que nos vira de tal maneira a cabeça para baixo que só lentamente conseguimos voltar a endireitar-nos. Sentimo-nos desprotegidos, sós face a um mundo hostil. Sem grande confiança em nós próprios.
E, até encontrarmos todo um novo equilíbrio entre o passado, o presente e o futuro, o sonho e a realidade, nós e o mundo à nossa volta, tudo tem de ser reavaliado.
Muitas vezes porém não fazemos esta reavaliação – cansativa, demorada ou dolorosa.
O confronto com o sentimento de perda é difícil sobretudo quando, ao acontecer inesperada ou aceleradamente, pode dar-nos a sensação de que tudo acabou e nada mais resta para lá desse fim.
Não conseguimos então ajustar-nos nem aceitar o tempo de espera até que a vida se reorganize e uma nova estrutura seja construída.
Em vez de deitar fora o móvel velho, não poderemos olhá-lo reparando naquilo que dele ainda gostemos e experimentar reciclá-lo e dar-lhe uma nova função na nossa casa talvez mais criativa?
No decorrer desse período de transição ao longo do qual se desenrola todo um processo de mágoa, só vivendo a dor poderemos a seguir andar com a vida para a frente.
Mudar só é possível a partir do reconhecimento e da aceitação da dor da perda. Sem pretender eliminá-la, dar-lhe tempo para que ela nos revele aquilo que num determinado momento temos de trabalhar em nós de forma a continuarmos a crescer.
Trata-se de acreditar que nada acontece por acaso e que não podemos controlar o curso da nossa vida. Que, quando algum tempo acaba é porque outro está pronto para começar e depende da nossa atitude interior permitir que a perda não só nos não nos deite abaixo mas também faça crescer como seres humanos.
Aprender a viver é ir tomando consciência de como todo este processo é comandado por algo superior a nós, mas nunca nos é imposto. Podemos atender ou não aos múltiplos sinais que a vida continuamente nos dá. Ou seja, responder ou não ao que nos é pedido, sugerido, solicitado.
Porque é que isto me está a custar tanto, porque é que esta dor não há maneira de passar?
Vou mas é assumir sem vergonhas o que estou a sentir e ver quais os recursos que de momento tenho que possam minorá-la…
Em vez de ficar agarrado ao passado, vou assentar bem os pés no presente e ousar acreditar que, quando uma porta se fecha, é porque há já uma janela a abrir-se por onde o futuro se anuncia!
Encaradas positivamente, as mudanças serão por nós vividas como uma espécie de passagens de nível que sempre nos levarão a crescer. Tanto mais quanto mais vivermos plenamente o presente.
Face a um relacionamento prestes a terminar, o melhor a fazer será portanto começarmos por nos perguntar a nós mesmos:
No fundo porque é que eu quererei acabar este relacionamento?
O que é que vou ganhar com isso? E o que é que mantê-lo me vai impedir de eu ser? Quais as expectativas que o alimentavam? Não poderei mudar nada na forma como o encaro?
Vivemos atualmente tempos de perda que simultaneamente são importantes tempos de auto-descoberta. Nunca como agora estiveram tão confusas as fronteiras que separam aquilo que, de facto, nos é essencial, de necessidades que apenas fomos adquirindo.
Há empurrões que nos estão a ser dados para avançarmos numa determinada direção, mas também limites que nos obrigam a parar.
Daí que haja em nós um desassossego resultante da velocidade com que exteriormente tudo se altera.
E, anestesiando-nos, uma procura obsessiva do imediato facilmente nos distraia do verdadeiro trabalho de mudança interior que todos estamos a ser impelidos a fazer.
É-nos mais fácil dar ouvidos ao que nos é dito a partir de fora do que prestar atenção aos sinais de mudança que interiormente se estão a manifestar.
Em vez de nos distrairmos da dor que sentimos – e que é o que nos leva a querer terminar uma determinada situação -, estamos por isso a ser convidados a procurar ouvir tudo o que, através das emoções que em nós desperta, ela pode ensinar-nos.
Autora de obras de desenvolvimento pessoal
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REVISTA PROGREDIR | AGOSTO 2012