Por Cristina Marreiros da Cunha
in REVISTA PROGREDIR | OUTUBRO 2020
(clique no link acima para ler o artigo na Revista)
Basicamente, porque, como diz Camões: “Todo o Mundo é composto de mudança tomando sempre novas qualidades”.
Sendo a vida composta de mudança, de equilíbrios e desequilíbrios que geram novos equilíbrios, ou, na terminologia de Jean Piaget, assimilações, acomodações e adaptações, sendo nós organismos vivos, tanto do ponto de vista biológico e fisiológico, como do ponto de vista psicológico, estamos sujeitos a estas mudanças. Também o mundo e o ambiente à nossa volta, quer o ambiente natural em toda a sua biodiversidade, quer o construido pelo ser humano, rege-se pela necessidade de mudança e adaptação.
É por isso natural e saudável que tenhamos necessidade de mudar, ou se preferirmos, sejam necessárias alterações e adaptações, para que possamos continuar vivos e de boa saúde.
Contudo, porque também nos acomodamos e criamos hábitos e rotinas que em determinado momento nos são favoráveis e funcionam, também por vezes resistimos à mudança, por um lado, por receio do que poderá ser diferente e desconhecido, e, por outro, porque nos agarramos à crença de que, se algo resultou até ali, é provável que continue a resultar, esquecendo-nos de que, entretanto, vários acontecimentos e processos se modificaram e que requerem que alteremos alguns comportamentos que já não são adaptativos, muito pelo contrário.
Mudar o Quê?
Simples. O que sentirmos como necessário. O que percebemos que deixou de funcionar, o que nos faz estar mal connosco e com os que nos rodeiam.
Centremo-nos na Saúde:
• Há inúmera informação sobre hábitos de vida mais saudável, nomeadamente quanto à necessidade de cuidados com alimentação e com a prática de exercício físico, mas também em relação à necessidade de abandonar comportamentos aditivos.
• Há inúmera informação, no momento presente, sobre hábitos e comportamentos a adotar no sentido de nos protegermos e protegermos os outros de infeção pelo SARS-Cov-2.
• Há também informação sobre os riscos de isolamento, da falta de convívio e de atividade, que podem afetar sobretudo os mais idosos e as crianças.
•Há ainda chamadas de atenção para o perigo da intensificação de sintomatologia ansiosa (nomeadamente a possibilidade de mais situações de pânico e perturbações do sono) e obsessiva, relacionadas com o Covid 19.
Cada um de nós, mediante o seu tipo de vida, os hábitos que tem, os problemas de saúde que o afetam, as recomendações médicas que recolhe, aquilo que lê, o que ausculta em si, do seu corpo e das suas necessidades psicológicas, vai percebendo, quais as mudanças que precisa de introduzir na sua vida com vista a um estado de saúde bio-psico-social mais equilibrado.
Mas se há tanta informação e nós próprios muitas vezes sabemos e sentimos que deveríamos mudar, porque não o fazemos?
Esta questão prende-se com as interrogações que se seguem:
Quando?
A resposta lógica seria, naturalmente, logo que tome consciência que tem de mudar.
Sabemos, no entanto, que muitas vezes a mudança é um passo difícil e que implica várias fases. Tomemos as fases de mudança do Modelo Transteórico (MTT) de Prochaska e DiClemente
1.Pré-contemplação — É como se ouvíssemos falar do problema, mas ele estivesse longe de nós, não sabemos mesmo se existe ou, até que ponto, nos diz respeito.
2.Contemplação — Já sabemos que é de facto um problema e que nos afeta, mas vamos adiando, esperando que se resolva por si, temos receio de tomá-lo nas mãos.
3.Preparação — Tomamos consciência que temos mesmo de agir e estamos preparados para o fazer.
4.Ação — Começamos a agir.
5.Manutenção — prosseguimos a ação.
6.Prevenção de Recaída — Há muitas vezes recuos ou desistências, há que tomar medidas para evitar desistir e manter a ação ou os ganhos obtidos.
Como podemos ver, o “Quando” depende do tempo que demorarmos entre a pré-contemplação e a preparação. Isto é, só será possível se ganharmos consciência de que temos um problema, se essa tomada de consciência, para além de alguns receios e dúvidas, trouxer também algum alívio no sentido de estarmos mais em contacto connosco e com o que experienciamos; perceber-nos como eficazes, permitindo-nos fazer um balanço de prós e contras da nossa eventual tomada de decisão.
Como?
Teremos novamente que reavaliar a situação, e vermo-nos com competência para mudar. É este percurso que permitirá chegar à fase de preparação para a ação e, na maior parte das vezes, são bloqueios emocionais e razões psicológicas que levam a que haja dificuldade em agir.
Um fator fundamental é assumirmos connosco, com plena liberdade de escolha, o compromisso de iniciar um processo de mudança ou adesão a novos hábitos, ou comportamentos.
Depois destas 3 primeiras fases haverá que:
•Manter a motivação e o compromisso connosco
•Estabelecer um plano de ação que:
— seja sentido como importante para o nosso bem-estar,
— seja realista e exequível,
— tenha alguma flexibilidade, (permita negociação connosco próprios)
— seja específico
— contemple formas de avaliar progressos, definindo metas de curto, médio e longo prazo que possamos medir e registar
— tenha um tempo para ser aplicado (mesmo que seja duradouro, há que definir um tempo para nos adaptarmos a essa mudança)
— preveja alguns obstáculos e recursos/medidas para ultrapassá-los.
•Não desanimar com os retrocessos típicos de qualquer processo de mudança, sabendo que os pequenos recuos fazem parte dos avanços a longo prazo.
•Congratular-nos e auto motivar-nos com os ganhos alcançados.
•Ter consciência da nossa liberdade de escolha em todas as fases do processo, dando-nos o direito de parar, recuar, introduzir alterações, estando conscientes das consequências que possam daí advir.
PSICÓLOGA E PSICOTERAPEUTA
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