in REVISTA PROGREDIR | SETEMBRO 2015
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Ter a convicção não confere nenhuma certeza, acrescenta apenas uma probabilidade.
A palavra perdão parece ter nascido, da união entre a palavra perder e a palavra razão.
Quando temos razão ficamos cheios, enormes, vitoriosos e quem sabe se ter razão muitas vezes, pode contribuir para a obesidade.
Mas ao contrário quando perdemos, sentimos como é gigante o vazio que nos cerca por todos os lados e nos sentimos enfraquecidos.
Quando a Perda encontrou a Razão encheu-se de coragem e pediu-lhe para falar com ela, só por uns breves minutos que fosse.
A Perda já não suportava mais a sua condição. Precisava urgentemente compreender o porquê da sua existência e a falta de afetividade que todos sentiam ao experienciá-la.
Ser Perda não é de todo brilhante, será que alguém já se debruçou sobre este assunto? Como te sentirias se te chamasses Perder e a tua vida fosse feita deste exercício?
A Razão não tinha muito tempo para falar em perdas, o assunto deixava-a ansiosa e cheia de vontade de começar a argumentar. Olhou para a Perda que cabisbaixa aguardava uma resposta e com voz forte disse:
-Se fores rápida posso ouvir-te, mas despacha-te!
A Perda procurou nos bolsos rotos as palavras apropriadas para não perder aquela oportunidade, mas só encontrava: dor, desilusão, tristeza, raiva e zanga.
Timidamente tirou as mãos dos bolsos e avançou para abraçar a razão. Certa de que as palavras que tinha não seriam as mais apropriadas para falar com ela, escolheu o silêncio de um gesto. Um toque, o calor e um encontro. Talvez isso fosse o melhor para preencher o seu imenso abismo sempre cheio de nada.
A Razão a princípio recuou, mas depois não foi capaz de negar o que a Perda lhe pedia sem ousar falar.
A Razão e a Perda abraçaram-se.
A Perda sentiu algo inexplicável. Parecia-lhe que tudo nela se encontrava e principalmente sentiu naquele instante, que ela própria perdia o medo de perder.
A Razão forte e determinada deixou-se abraçar e aos poucos relaxou e entregou-se. Dentro do seu peito largo e expandido alguma coisa se perdeu, mas inversamente ao que seria de esperar, essa perda não a fez argumentar, não lhe trouxe qualquer sentimento de rejeição.
Esticou os seus braços fortes e envolveu delicadamente a frágil Perda contra si.
O tempo parou, ele queria assistir a este momento porque era único, e tudo o que é único tem um desconto no tempo.
Do céu desceu um clarão. A Razão e a Perda estavam tão absorvidas pela sua união que nem deram por ele.
E Deus do alto fez-se ouvir:
-Muito bem. Estou imerso em alegria, graças à vossa a atitude e à tomada de consciência da importância da vossa união, hoje deram à luz o Perdão.
A Razão e a Perda baixaram os braços, soltaram os seus corpos, expiraram o ar contido. Olharam atónitas e viram um ser luminoso, de cabelos dourados e olhos pretos que as fitava sorridente.
O Perdão agradeceu e docemente falou:
-Há sempre uma razão quando há uma perda.
E fazendo uma vénia afastou-se.
Quando fazemos algo único, algo único nasce. E nasce sempre o que precisamos. E o que nós precisamos alguém mais precisará.
Quando tiveres razão muitas vezes, procura o Perdão e agradece à Perda.
Sempre que perdoamos e nos perdoamos, alinhamos o coração que bate no nosso peito com aquele que ecoa em todo o universo.
Depois sentirás o clarão a preencher-te e não terás certezas, sentirás apenas que estás bem, que te encontras em cada perda, e que todas as razões são como sinos a tocar, para te despertar.
E de cada vez que aceitares perder a razão receberás um abraço do Perdão.
in REVISTA PROGREDIR | SETEMBRO 2015
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