Por David Rodrigues
in REVISTA PROGREDIR | DEZEMBRO 2013
(clique no link acima para ler o artigo na Revista)
A dúvida é, se as relações laborais em Portugal e no Ocidente em geral têm esse equilíbrio entre o que se faz e dá e o que se recebe, quer para os trabalhadores quer para os empregadores. A resposta taxativa é: NÃO!
No entanto, e embora a conclusão seja simples, as premissas e a análise subjacente nem sempre são tão simples, porque precisamos de distinguir entre micro e pequenas empresas e médias/grandes empresas. Nas primeiras o equilíbrio é mais difícil de encontrar e a balança desequilibra-se para os 2 lados, umas vezes saem beneficiados os patrões, outras os empregados, porque desde o temperamento das pessoas, aos conhecimentos legais, motivações, produtividade, sucesso do negócio, honestidade e ética, a variação de um dos fatores altera significativamente o resultado final do equilíbrio desejável nas relações laborais entre quem investe num negócio e quem se emprega no mesmo.
Nas empresas de maior dimensão, a realidade é na sua maioria (felizmente existem exceções) altamente dececionante do ponto de vista de dignidade e respeito humano e laboral, bem como da competência e efetiva gestão de recursos, neste caso em particular, na gestão de recursos humanos. Vamos a questões concretas que consubstanciam esta visão:
• A remuneração e preponderância do fator capital assumiu um peso esmagador, de proporções que historicamente nunca teve, face à remuneração e importância atribuída ao fator trabalho, criando acentuados desequilíbrios de poder e de compensação financeira;
• Em muitas empresas espera-se (no sentido de obrigação e dever) que os trabalhadores trabalhem mais horas do que aquelas para as que foram contratados, sem terem direito a receber mais por isso, chegando a casos de absoluta exploração e atentados contra a dignidade e os direitos humanos. Quem não o faz, é muitas vezes ostracizado e mal visto pelas chefias, mas hoje em dia até pelos próprios colegas, que muitas vezes, assimilaram a cultura de abuso, como normal. O oposto seria os trabalhadores esperarem/exigirem que o patrão lhes pagasse mais do que o salário acordado, sem nada fazerem para o merecerem;
• Os níveis de insatisfação e desmotivação têm aumentado progressivamente pela falta de justa remuneração, pela falta de reconhecimento do trabalho desempenhado e pelos exagerados níveis de stress existentes, conduzindo a menor produtividade, menor bem-estar e aumento de doenças e patologias do foro psicológico e consequente aumento do absentismo;
• Os sistemas de avaliação que supostamente servem para reconhecer o mérito e esforço são, em muitos casos, elaborados sistemas de congelamento de carreiras e ordenados, impedindo a mobilidade e progressão dentro da empresa. As principais falhas de muitos destes modelos são: o estabelecimento de objetivos irrealistas, desadequados às funções e determinados de forma unilateral por parte da entidade patronal; a aplicação desajustada e por vezes absurda de critérios e modelos estatísticos que não são adequados à realidade laboral; e o condicionamento artificial do mérito e qualidade do trabalho desenvolvido. A título de exemplo, por questões estatísticas não pode existir uma equipa de 5 pessoas todas com bom desempenho, se o desempenho da empresa foi médio (mesmo que nem sequer exista alinhamento de objetivos entre a equipa e a empresa);
• Por vezes, a existência de processos ou disputas internas que não permitem otimizar o desempenho de departamentos ou direções por falta de pensamento estratégico ou conhecimento operacional de quem decide ou pela complexidade dos procedimentos internos, ou ainda pela falta de alinhamento entre departamentos tendo em vista o bem comum da empresa;
• A incipiente potenciação e valorização dos recursos humanos. Mesmo na era da globalização, da terciarização e novas plataformas tecnológicas e de comunicação, as pessoas continuam a ser a essência de uma empresa. Quando não são vistas como um recurso-chave, isso produz maus resultados no médio/longo prazo. Pois a exploração imediata pode trazer um aumento de resultados e lucros no curto prazo, mas o esgotamento das pessoas e a desmotivação, traz custos de produtividade, formação, substituição, desinteresse muito superiores aos ganhos obtidos, tornando-se por isso uma má gestão de recursos humanos.
A História do Futuro – Como Deve Ser?
Por todas as questões referidas anteriormente e pelo momento que atravessamos, estamos numa fase histórica da vida em sociedade, em que nos aproximamos de um ponto de viragem, também nas relações laborais, sendo altura de recuperar a dignidade do trabalho e do ser humano, e travar a exploração e violação dos direitos humanos a que todos assistimos em Portugal e noutros países, ditos desenvolvidos. Chegou a hora de a nível de país deixar de olhar apenas para o PIB, défice, exportações ou dívida pública e olhar para o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), para o Índice de Pobreza, Felicidade Interna Bruta ou outros indicadores que contemplem as dimensões sociais, culturais, ecológicas e de igualdade entre as pessoas, além das questões económicas. Dentro das empresas, além de se olhar para o lucro por ação, margem operacional, ROI (Return on Investment) entre outros indicadores financeiros, é importante começar a olhar para o rácio entre o salário mais baixo e mais alto dentro da empresa, integrar no valor da ação: a política de responsabilidade social, indo ao encontro dos objetivos sociais que todas as empresas devem ter, e que começam pelos próprios trabalhadores; a componente ecológica e de sustentabilidade da empresa na utilização de matérias-primas, na gestão dos recursos como papel, plástico, eletricidade, água no país-sede e em todas as filiais e representações; o respeito pelos direitos humanos em todo o processo de relação comercial; a avaliação do nível de corrupção; a avaliação dos níveis de satisfação de consumidores e trabalhadores, entre outros fatores que permitem de uma forma muito mais autêntica saber qual é o valor acrescentado de uma empresa na sociedade em todas as suas dimensões, porque de que nos adianta gerar muito dinheiro, se não tivermos planeta nem pessoas para o habitar?
Também a visão dos sindicatos precisa de sofrer uma evolução, o seu papel não pode ser defender apenas as questões substantivas do emprego, como direito a um salário justo, conciliação da vida profissional e familiar, mas contribuir para que as empresas sejam um espaço de realização pessoal e profissional, de construção de mais-valias para a sociedade nos produtos e serviços que desenvolvem, de permitir que as pessoas não tenham um trabalho para sobreviver, mas vivam e desfrutem da oportunidade de contribuir numa área com que se identificam e têm competências adequadas (intelectuais, sociais e emocionais). Talvez a conotação sindical de defesa dos trabalhadores, tenha de evoluir para estruturas diferentes dos sindicatos, que são maioritariamente protestativos e reivindicativos, e precisamos de algo diferente, talvez como movimentos de defesa social ou movimentos de promoção e integração laboral que tenham um espírito e postura de desenvolvimento pessoal, social e profissional de todos os associados.
Estamos a viver um momento histórico, e isso exige uma grande definição, se queremos construir a história ou ser apenas parte da história que outros escreverão.
CONSULTOR MONEY LIFE
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