in REVISTA PROGREDIR | DEZEMBRO 2014
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O João tinha 15 anos e tinha um sonho, viver numa casa grande onde não fosse necessário partilhar o seu quarto, onde não tivesse que dividir o seu espaço e tempo, onde pudesse ter as suas coisas e não tivesse receio de que alguém as fosse usar.
Filipe, seu irmão e companheiro de quarto, adorava usar as suas roupas e adorava bisbilhotar os seus segredos. E o João detestava tudo isto.
À noite, quando rezava, perguntava secretamente a Deus se era assim tão mau da sua parte, ter o sonho de ser rico. Se era sinal de egoísmo desejar ter o seu canto e se era demasiada ambição imaginar que seria grande a sua casa.
Mas Deus parecia permanecer em silêncio, e ele não sentia que era realmente ouvido.
Noite após noite ele rezava a oração que os pais lhe haviam ensinado, mas depois terminava sempre com o mesmo pedido:
“Deus faz com que eu seja rico, para que possa comprar uma casa grande com jardim e piscina e que ninguém vá ao meu quarto sem minha autorização. Ámen.”
Quando pedimos algo com muita convicção, contribuímos para a união das forças do universo, e deste modo criamos um caminho para a realização do nosso desejo. Tricotamos fios de oportunidades que surgem na nossa direção.
E um dia podemos ser surpreendidos com a malha tecida para vestirmos os nossos sonhos.
Mas se isto é em parte verdade, também não deixa de ser verdade que a nossa visão é pouco global. Geralmente vemos com maior nitidez tudo o que está à nossa frente e escapa-nos muitos detalhes do restante que nos rodeia, de tudo o que está além do nosso alcance de visão.
O tempo passou e o João tornou-se homem, formou-se em arquitetura, teve êxito e tornou-se rico. Desenhou a sua própria casa, grande com jardim e piscina e viu realizados os seus sonhos.
Todos aplaudiram o seu sucesso, os manos e mana, os amigos, colegas e os conhecidos.
Os pais estiveram presentes no dia em que a casa foi apresentada e emocionaram-se. O João também e sentiu que mesmo depois de atingirmos os centímetros finais na métrica do corpo, podemos continuar a crescer noutras direções.
Sozinho deitado na sua cama, rodeado de muito espaço e de uma vista lindíssima, esqueceu-se de agradecer a Deus.
Os anos foram passando e o João continuou a usufruir de tudo com que sempre sonhara. Continuou sem precisar de partilhar o seu quarto, as suas coisas e a sua casa. Ouvia apenas a musica que escolhia e o mesmo se passava com tudo o que o rodeava, as escolhas eram apenas as suas. A sua vida tinha apenas um ritmo, o seu ritmo.
Um dia foi visitar a irmã que organizou uma festa de despedida, após ter decidido partir para outras margens em missão, como voluntária.
Benedita, a sua irmã, que depois da tia falecer sempre dormira no seu quarto sem ter de o dividir com mais ninguém, fez um pequeno discurso para toda a família, onde revelou que à noite quando rezava, pedia sempre a Deus que lhe indicasse o caminho para poder concretizar o propósito da sua vida.
Segundo ela, viver era uma experiência tão valiosa que seria lamentável perder-se em escolhas vãs.
João recordou-se que no quarto ao lado ele pedia coisas e nunca pensara no que tinha para dar e de repente surgiu-lhe a imagem que Deus deveria ser de uma mulher para conseguir registar ao mesmo tempo tantas coisas.
A irmã ali estava a comemorar o presente de Deus para com ela: ter descoberto o seu caminho. “Partilha” - disse ela.
-“Descobri que partilhar é o meu propósito, e é isso que vou fazer, oferecer o que sei para ajudar os que não podem pagar.”
João abraçou a irmã e voltou para a sua casa grande, cheio desse abraço. Sentou-se no seu grande sofá, bebericou um chá nas suas chávenas de porcelana, e pensou em tudo e repensou.
Às vezes, as nossas dificuldades tornam-nos seres pequenos e por isso desejamos coisas grandes, outras vezes, tornam-nos tão imensos que transbordamos e só nos resta partilhar.
Uma parte de nós precisa sempre de ser alimentada, outra pede para ser partilhada.
Quando só alimentamos é natural o excesso de peso, quer no corpo quer na alma.
Quando só damos é natural a fraqueza, no corpo e no ser.
Por isso partilhe-se com saber e descubra qual a sua melhor maneira de o fazer. Cada um tem a sua e isso é o mais importante para aprender.
NATÁLIA RODRIGUES PORTO in REVISTA PROGREDIR | DEZEMBRO 2014 (clique no link acima para ler o artigo na Revista) |