Por Marta Nogueira
in REVISTA PROGREDIR | JANEIRO 2016
(clique no link acima para ler o artigo na Revista)
A minha mãe sempre me avisou que nunca se deveria pôr as mãos no fogo por ninguém, nem mesmo pelo nosso mais que tudo. Eu fui acrescentando ao longo da vida e das diversas traições a que fui sujeita, de toda a ordem, espécie e feitio, que até de nós próprios devemos desconfiar e nunca afirmar “Desta água não beberei”.
Fogo e Água. Perigo e Veneno. Paixão e Vida. São essas as moléculas que compõem a alma humana e, por consequência, os caminhos por onde deambulamos. A confiança pressupõe estabilidade, mas esta raramente permanece imutável durante muito tempo. Os outros são miragens, reflexos dos nossos espelhos mentais e, por isso, nunca totalmente límpidos ou transparentes, e nós próprios, apesar de preservarmos algumas características basilares, somos também fogos fátuos flutuando constantemente nas águas de um rio trepidante.
E parece existirem apenas duas coisas certas nesta vida, é o que dizem – a morte e os impostos. Nesses podemos confiar, porque nos calharão a todos. E, no entanto ... já ouviram falar em criogenação? Há por esse mundo uns quantos milhares de milionários parados no tempo, à espera de enganar a morte. Quanto aos impostos ... quem não tem telhados de vidro que atire a primeira pedra.
Em quem ou no que poderemos confiar, nesse caso? Confiar total e incondicionalmente? Na certeza da desconfiança. Não porque este mundo seja uma vil desilusão e as pessoas párias sem salvação possível, mas porque pura e simplesmente a natureza da vida e, por consequência, a natureza dos seres que dela fazem parte, não é estática e imutável. Nem mesmo a das rochas que formam as gigantescas montanhas que nos abraçam. Também elas mudam, eventualmente, ainda que a um ritmo muito diferente do nosso. Assim, poderemos concluir que a confiança é, à semelhança do espaço e do tempo, como diria Einstein, um conceito relativo. Que se altera consoante a nossa posição espacial e temporal. Se eu colocar um bonsai num pequeno penhasco protegido, posso confiar que ali se manterá para sempre. Mas ... o bonsai tem um tempo limitado de vida ou ... existem intempéries meteorológicas e geológicas ou... bactérias e vírus inesperados ou ... eu mesma posso arrepender-me, sentir saudades ou remorsos por ter abandonado o meu pequeno bonsai num penhasco solitário e resolver que ele fica muito melhor no parapeito da minha janela.
Tudo pode mudar, num repente. Até a morte e os impostos. E se tudo pode mudar, sem que sobre isso tenhamos qualquer responsabilidade ou controlo, então o conceito de confiança é um falso conceito. Mesmo que estejamos confiantes de com ele termos convivido desde os bancos da escola, nos dicionários que dedilhámos ao longo da vida.
VIAJANTE DO MUNDO E DAS PALAVRAS
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