in REVISTA PROGREDIR | ABRIL 2019
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Quando não comunicamos a nossa zanga no momento certo, assertiva e generosamente, suprimimos fúria. Fica lá, matura-se e nunca desaparece. Criamos zanga dentro de nós que, ao longo dos tempos, vai passando de momentos de raiva para gerar uma vida de agressão. A autoagressão é uma forma de violência. Talvez a maior forma de violência, pois nenhum ato violento ao exterior existe sem o belicismo interior.
Porém, o que é “Violência” no seu conceito? A perceção do que é “violência” condiciona o próprio ato, pois a partir dessa crença são criados filtros para o “bom” e para o “mau” e dessa forma, se a crença estipulada nos remeter para o que “não é violência” pode acontecer, muito frequentemente, uma usurpação do conceito levando a ultrapassar os limites da dignidade humana.
Observando um ato violento como tudo aquilo que inflige dor e priva o indivíduo do bem-estar físico, mental e emocional – seja esse ato infligido em si próprio ou no outro – então, a auto-violência é a primeira forma de violência, e nela se geram todas as outras manifestações violentas possíveis.
O indivíduo é criado, no geral, para a não-agressão. É educado para não violentar o espaço ou identidade de um outro indivíduo, não lhe gerar dor física, mental ou emocional ou ter qualquer outro comportamento que incorra num dano à esfera do respeito pelo próprio. Contudo, aquilo que não nos é ensinado é que a primeira manifestação de violência ocorre quando o desrespeito acontece inicialmente dentro de nós. Ao não sermos educados para a compreensão e para a amorosidade do que é a nossa sombra, fazemos nascer um espaço vazio de desidentificação connosco, que facilmente denominamos como “autocontrolo”. Por norma, vemos a repressão de emoções como sinónimo de não-agressão.
Suprimir as emoções consideradas, culturalmente, como negativas, escondê-las e esquecê-las é a criação de uma mutilação subtil, um abuso camuflado. Suprimir emoções traz a doença, seja mental ou física, seja emocional. A raiva, o ódio, a zanga, a inquietação, existem e fazem também parte de nós. São emoções presentes em qualquer Ser Humano e a energia gasta em agir em contradição da expressão saudável dessas mesmas emoções é maior do que a energia dispensada a canalizá-la saudavelmente.
A amígdala, essa estrutura responsável por nos avisar dos perigos eminentes, dá-nos a possibilidade de estar preparados para o ataque ou fuga perante determinados estímulos. Ao serem desencadeados determinados impulsos nervosos, podemo-nos sujeitar a ceder a essas emoções não benéficas quando não é ativada a consciência perante o momento, quando o nosso espaço interior não é visto como sagrado, quando o momento não é sustido pelo tempo necessário. Utilizar o nosso, tão bem-dotado, neocórtex e todas as suas ferramentas de entendimento intelectual auxilia-nos a olhar para dentro, a olhar em Consciência e, por fim, olhar em Amor.
Deixar sair a fúria em Amor é limpar o organismo de doenças futuras, é possibilitar a expansão do Entendimento. Daí a importância nos enfurecermos em honestidade e não para alguém de forma gratuita. A Consciência e o autoconhecimento são o caminho mais honesto para a redução de autoagressividade e, por consequência, para a menor manifestação da agressão ao Outro já que a aceitação das nossas sombras traz a ausência da luta no longo-prazo. Assim, a educação para as emoções é, per se, uma forma de educar para a não-agressão.
Sermos honestos com a nossa zanga e comunicá-la, seja para nós ou para os outros, não é sinónimo de fugir à bondade ou cegarmo-nos à crueldade que podemos emanar. A assertividade impede a agressividade.
A assertividade, entre outras coisas, é o ato de sermos honestos face à nossa verdade e, com generosidade, sermos francos com os outros. Torna-se uma questão de perspetiva, na medida em que, o desamor, a culpa, a não aceitação são prisões emocionais que, mais tarde ou mais cedo, terminam numa catarse violenta da repressão imposta durante tanto tempo. Numa perspetiva de generosidade para connosco mesmos e, por consequência para o com o Outro, é o olhar com Verdade, é o reconhecer o Sentimento e aprender a amar a Sombra que se manifesta como transformador e libertador. O amor por nós, aceitando com carinho, que somos também o que, inicialmente, não queremos ser, trazem leveza ao sentimento. A honestidade emocional e intelectual é um ato de Amor por nós, é uma forma de generosidade para com o Outro. Ao buscarmos o Entendimento da nossa própria humanidade trazemos connosco a Mudança.
É possível estar zangado sem Ser zangado. Nesta escolha, mais do que descobrir o gatilho que despoleta o salto para a agressão, será importante compreender onde e como nos relacionamos com o que é “violência”. Olhar as crenças que nos regem e como as projetamos no Outro, perceber em que parte do caminho a nossa permissão para nos manifestarmos invade o espaço daquele com quem nos confrontamos. No fundo, impulsionar a visão sob um outro olhar e, assim, o entendimento genuíno.
A mudança de perspetiva transforma a forma de expressão: aquilo que poderia tornar-se violência pode viver em amorosidade.
TERAPEUTA TRANSPESSOAL
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