Por Natália Rodrigues Porto
in REVISTA PROGREDIR | MAIO 2015
(clique no link acima para ler o artigo na Revista)
Alma fechou a mala, olhou-se ao espelho, ajeitou o cabelo e perdeu-se nesse olhar, imaginou que o espelho era uma porta para o lugar onde decidira ir e viu-se do outro lado, enquanto ainda tinha a oportunidade de olhar para si parada no seu quarto. Que diferença faria se pudéssemos sair de nós e assistir ao desenrolar da nossa vida? Se tivéssemos o poder mágico de sermos observadores do nosso comportamento?
Alma puxou a mala e fechou a porta do seu quarto. Percorreu o corredor, olhou cada detalhe em seu redor e pensou em como uma decisão pode mudar a nossa perspetiva de tudo, até daquilo que sempre esteve perto de nós e que há muito não reparávamos. A sua casa parecia-lhe mais bonita que nunca agora que decidira deixá-la. O som das rodas da mala no chão recordava-lhe que o caminho estava a ser feito e que era preciso continuar, olhar para trás pode impedir-nos de seguir.
Quando a porta se fechou, quando a chave deu a volta que trancou a casa, Alma respirou fundo. É preciso coragem para fechar as portas que nos acolhem, é preciso coragem para escolher aquilo que nos cabe na mala e que nos acompanhará, é preciso coragem para decidir.
Alma observou a cidade a ficar cada vez mais distante e que ao mesmo tempo revelava a sua forma. É assim que funciona a distância, distancia-nos dos detalhes e dá-nos a oportunidade de ver o todo.
Olhou em frente e fechou os olhos, 4h estaria no ar, apesar de ser uma decisão que tomou com os “pés na terra” seria o ar o meio de a concretizar, porque tudo tem uma frente também tem um dorso.
Adormeceu, entregou-se aos sons circundantes e deixou-se partir.
-Vamos começar a mexer os dedos dos pés, a sentir as nossas pernas, tragam a consciência ao vosso corpo
Alma começou a ouvir a voz do professor de meditação, mas não queria acordar, ainda não tinha chegado onde tinha decidido ir e estava demasiado entusiasmada com a sua viagem, mas indiferente o professor continuou:
-Sintam as vossas mãos. Mexam cada dedo, sintam-se retornar ao vosso corpo.
Alma lutava para ficar sentada no seu avião, olhava para trás e via os seus colegas agitados a estirarem o corpo e ela sentia-se tão bem como estava e não queria mesmo sair do estado em que se encontrava, mas a voz do professor tornou-se demasiado próxima e o avião esfumou-se no ar, dissipou-se entre as nuvens do seu pensamento.
Deitada no chão, acordou do relaxamento. Abriu os olhos e sentiu o seu corpo, teve consciência do lugar, teve consciência de tudo o que a rodeava.
Lentamente levantou-se, sentou-se esperou.
O professor olhando os seus alunos perguntou:
-Alguém tem algo que queira partilhar?
O silêncio fez-se grande. O professor olhou em volta, à procura nos olhares a vontade de falar.
Alma hesitou, mas o seu corpo não, e o professor captou a sua hesitação.
-Sim Alma?
Então a Alma libertou-se, deixou as palavras levantarem voo e falou da sua viagem, da sua decisão em a realizar. Falou de tudo com muitos detalhes, e à medida que ia falando sentia-a a vibrar.
Os outros escutavam-na demonstrando interesse e isso ainda a motivava mais. Chegou ao ponto em que teve de acordar, e ouviu-se um oh! Coletivo que terminou com uma risada geral.
O professor agradeceu e disse simplesmente:
-Bonita a sua viagem espero que a consiga entender, e que descubra o que significa para si e para a sua vida.
Breves momentos depois a aula terminou e Alma seguiu a sua viagem até casa.
Ligou o rádio e deixou-se levar na melodia da música que embalava a sua condução.
Qual é a diferença entre uma viagem interior e uma exterior?
Se calhar é muito menor do que supomos.
Podemos ser impedidos por muitas razões de viajar, mas não podemos desperdiçar a oportunidade de nos conhecermos, de conhecermos os nossos destinos, os nossos sonhos, porque tudo isso mora dentro de nós, e o que não tivermos dentro, nunca poderá existir fora.
in REVISTA PROGREDIR | MAIO 2015
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