Porque queremos e não queremos, gostamos e não gostamos, sentimos e não sentimos, somos e não somos, tantas vezes de formas diferentes e até em simultâneo? Por Susana Amaral in REVISTA PROGREDIR | DEZEMBRO 2021 (clique no link acima para ler o artigo na Revista) |
Sentimos alegria e tristeza, ilusão e desilusão, felicidade e dor, coragem mas também medo. Somos emoção e razão, fortes e fracos. Rimos e choramos ao mesmo tempo. Gostamos de luz e sol, mas há momentos em que queremos escuro e solidão. Podemos sentir-nos felizes e desesperados no mesmo dia. Apercebemo-nos com tendo uma série de traços muito específicos, decisivos e absolutos, mas, na realidade, quem somos, o que gostamos, o que queremos verdadeiramente?
Muitas vezes a nossa visão pessoal limita-se a ver tudo o que nos rodeia e a nós próprios, em termos absolutos e dicotómicos. As pessoas são boas ou más, racionais ou emocionais, felizes ou infelizes, inteligentes ou ignorantes, verdadeiras ou falsas... A Sociedade, a cultura, a educação, a família, impõem comportamentos apropriados e relegam comportamentos fora dos padrões estipulados. Há um padrão de normalidade que nos é imposto, de acordo com uma média que não se ajusta à diversidade e complexidade do Ser Humano. Medida essa que não serve para todos e que deixa muitos a crer que não podem ser ou sentir-se diferentes.
Felizmente não somos todos iguais e é a diferença que torna o Ser Humano mais interessante, especial e único.
Embora todos cheguemos completos a este mundo, a nossa educação, experiências, o contexto e nós mesmos, escolhemos e decidimos, consciente e inconscientemente, o que queremos mostrar, desenvolver, ocultar ou rejeitar. Reunimos qualidades, capacidades e características que, por si só, constituem uma diversidade rica e às vezes até contraditória.
Vivemos a vida à procura de coerência, quando é de incoerências que é feita a própria existência. E talvez uma das maiores missões de vida, seja aprender a viver no equilíbrio das dualidades.
É na liberdade de poder ser, estar, pensar e sentir diferente, que se dão as maiores expressões de criatividade, de conhecimento, de crescimento e desenvolvimento humano. E quando negamos os nossos defeitos, medos e erros, negamos a nossa essência, que é feita de perfeição e imperfeição, de bom e mau, de certo e errado. Não existimos como seres completos, sem os nossos comportamentos, sentimentos ou emoções ‘inaceitáveis’. Eis a dualidade.
O que não aceitamos, evitamos reconhecer ou melhorar em nós, é relegado à ‘sombra’. O ato de esconder o que não se quer assumir, gera sofrimento e contradição.
(Carl Jung)
Compreender a dualidade do Ser humano é acolher que somos feitos de contradições, de amor e ódio, de felicidade e tristeza, de abundância e escassez, de corpo e mente, de crescimento e regressão, de matéria e energia, enfim, de tantas dualidades que influenciam o nosso viver! É da conjugação das dualidades que se forma a unicidade de cada um.
Procurar o autoconhecimento, o amor, a cura. Viver cada emoção no seu tempo, no aqui e no agora, aprendendo a encontrar a luz e acolher a sombra, a crescer e renovar, num movimento cíclico de metamorfose constante. Escolher viver, ao invés de fugir do que se sente. Não se pode escolher sentir ou viver pela metade. Fugir da sombra, da dor, do medo, não se permitindo sentir, é perder a luz, alegria e bem-estar que se pode ter. Não haveria consciência de um, se não fosse pelo outro. Precisamos Ser em plenitude, com o que magoa, amedronta e faz sofrer, mas também com tudo o que nos traz êxtase, alegria, felicidade, amor, compreensão, aprendizagem e tantas emoções e sentimentos positivos, que dão sentido ao nosso viver. Não há felicidade sem dor, alegria sem tristeza, luz sem sombra. Ser feliz exige esforço e dedicação.
Importa reforçar que a ideia não é deixar que o lado negativo, da dor, sofrimento, medo, sombra se apodere de nós sem nada fazer, mas sim reconhecer e acolher, para que possa ser trabalhado positivamente.
A vida não é absoluta e dicotómica, não é preto ou branco, certo ou errado... No ser humano, assim como na própria vida, tudo é relativo e pode mudar num dado momento.
O autoconhecimento e desenvolvimento pessoal, não é sobre tornar-se algo ou alguém, mas sobre ser honesto consigo mesmo e (re)conhecer as suas ‘imperfeições’, aceitá-las primeiro, para que possa ajustá-las, experimentando a liberdade de Ser, num equilíbrio possível entre mente e coração, razão e emoção, pensamento e ação. Tornar coerente a incoerência da dualidade, tomando as ‘rédeas’ da sua vida e fazendo as suas escolhas e decisões com consciência.
Este (re)conhecimento e (re)conciliação pode ser feito no campo terapêutico, permitindo conhecer de forma consciente, pensamentos, emoções, sentimentos, memórias, experiências que sustentam a verdadeira essência e identidade. Questionar possíveis crenças, regras, tradições, convidando a libertar-se do conhecido e abraçando a busca de um possível desconhecido, saindo da zona de conforto na expectativa de alcançar algo maior que traga liberdade e tranquilidade.
Há uma tendência para negar um dos lados da dualidade para evitar o sofrimento. Mas, o que é a realidade? O certo? O errado? O melhor e o pior? Haverá uma só realidade ou conjugação de diferentes perspetivas para cada um? Viver é aceitar cada uma das possibilidades e encontrar um equilíbrio personalizado para os seus polos. É permitir-se viver nesta realidade dual, encontrar equilíbrio neste desequilibro e coerência nas incoerências. Aceitar o bom e o menos bom do que é, afinal, Viver!
SUSANA AMARAL PSICÓLOGA CLÍNICA, FORMADORA E COACH www.SusanaAmaral.pt www.ClinicadasEmocoes.pt www.akademiadoser.com/susanaamaral [email protected] in REVISTA PROGREDIR | DEZEMBRO 2021 (clique no link acima para ler o artigo na Revista) |