in REVISTA PROGREDIR | JUNHO 2021
(clique no link acima para ler o artigo na Revista)
Por que razão é tão importante celebrarmos? As nossas memórias tendem a ficar enevoadas ou esquecidas, arrastadas para recantos longínquos da nossa mente. Memórias felizes, de amor, do bem, do belo, do divino bem como as memórias de dores absurdas, de choques, sustos e mortes. Linhas do tempo que se cruzam ao longo da nossa existência.
Quando passamos por processos de luto; quando nos vimos completamente perdidos, quando estamos a sentir muita dor ou tristeza parece mais natural nos vitimarmos e nos entregarmos ao sofrimento do que celebrarmos. Nessas alturas sentimo-nos desligados.
É por isso que as celebrações são tão importantes para a nossa vida espiritual. O próprio ato de celebrar ancora-nos numa história mais profunda — que precede qualquer sofrimento ou dor atual. Parte de um princípio que nos guia e nos é comum e que nos mantém ligados. Dá-nos o sustento, o aconchego e o calor. Lembra-nos de onde viemos, quem somos e para onde nos dirigimos e com quem. Faz-nos sair da ilusão e do medo. E recorda-nos que nunca estivemos sozinhos, nem nunca estaremos. Que tudo na vida comporta um princípio e um fim! Que tudo é impermanente.
As celebrações são momentos fora do tempo comum que nos permitem integrar tudo aquilo que vivemos e, olharmos para essas experiências com gratidão. E é só a partir daqui, desta consciência onde a gratidão, o amor e a maturidade se expressam, que doravante, podemos fazer diferente e melhor, tornando-nos seres mais responsáveis e dignos da dádiva que nos foi oferecida: a Vida.
Há pouco tempo estive no funeral de uma mulher sábia e profundamente amorosa e inspiradora que foi (e sempre será) uma mãe para mim. Houve lágrimas de profunda dor e tristeza, mas também lágrimas de pura alegria. Estivemos reunidos num grupo onde celebrámos com canções e danças, ligados a esse sentimento mágico dos ciclos de vida/morte/vida, onde tudo se renova uma e outra vez. Honrando a vida e os ensinamentos que essa mãe nos deixou, e tal como um bom filho, traduzindo em palavras este sentimento incomensurável de gratidão: “Irei honrar e dignificar o meu caminho com tudo o que aprendi contigo”. Em cada respiração, em cada movimento do meu corpo, em cada canção pude senti-la e celebrá-la. No fim da cerimónia, apareceu o arco-íris que me lembrou a história de Buda quando desceu dos céus, iluminado por uma escada de sete cores, um arco-íris como ponte entre os mundos.
Independente da situação que estamos a viver há sempre motivos para celebrarmos, basta procurarmos para lá do superficial e dos véus da ilusão. E temos infinitas formas de o fazermos: observar os pequenos “nadas” disfarçados de dádivas quer seja a chegada da primavera, um amanhecer ou uma chuva quente de verão. Quando superamos os nossos limites; quando descobrimos que a solidão não é estarmos sozinhos, mas antes o reencontro com a nossa essência; que o luto nos dá ferramentas preciosas para nos recriarmos em seres humanos mais compassivos e amorosos. Quando estamos com os que amamos. Ou quando enfrentamos grandes desafios e, sujeitos às mais diversas tentações e saídas fáceis, não nos rendemos e não nos deixamos corromper:
Estarmos presentes nas grandes celebrações da vida é tão importante como naquelas a que chamamos de pequenas, mas que na verdade muitas vezes até são as que mais nos impactam. Estarmos suficientemente despertos para assinalar os marcos dos nossos momentos íntimos que mais ninguém se apercebe a não sermos nós próprios e celebrar, ritualizando os pequenos momentos, observando e saindo da nossa rotina. É como acedermos a um portal onde celebrando prestamos homenagem a tudo o que existe dentro de nós e para lá de nós, conferindo significado a tudo, sacralizando toda e qualquer experiência, retirando as caixas e as fronteiras do que é positivo ou negativo.
Em O Profeta, Kahlil Gibran, o poeta e filósofo libanês, escreveu: “Quanto mais profunda a tristeza penetra no teu ser, mais alegria tu podes conter. Não é a taça que contém o teu vinho a mesma taça que foi queimada no forno do oleiro?”
Esta citação sugere que a nossa capacidade de alegria e a nossa capacidade de celebrar a vida devem corresponder à nossa experiência de dor. Jesus diz algo semelhante: “A tua dor se transformará em alegria.” Confiarmos que a nossa vontade indomável tem a capacidade de conter e transmutar todas as experiências por mais dolorosas que algumas sejam.
Caminhemos então celebrando e sentindo a vida plenamente, bebendo dela até ao último trago: “O choro pode durar toda a noite, mas vem um grito de alegria pela manhã.”
COACH, HIPNOTERAPEUTA, FORMADORA
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